O que é?
O Direito Real de Habitação é a garantia reconhecida ao cônjuge (ou companheiro) sobrevivente[1], independentemente do regime de bens, de permanecer residindo no imóvel de natureza residencial que serviu de lar para o casal[2], após a morte do (a) cônjuge ou companheiro (a).
Esse instituto jurídico constitui-se em direito real sobre a coisa alheia de caráter vitalício, e está previsto no artigo 1.831 do Código Civil[3], bem como na Lei nº 9.278/96. Logo, para que se faça jus ao Direito Real de Habitação não é necessário que o cônjuge/companheiro sobrevivente tenha direito à meação do imóvel ou direito à herança do falecido. Apenas é imprescindível que o imóvel tenha servido como residência da família e que seja o único dessa natureza a inventariar.
O Direito Real de Habitação se extingue caso o cônjuge/companheiro sobrevivente constitua nova família?
Não. Essa era a previsão do artigo 1.611, §2º do Código Civil de 1916, que foi revogada pelo Código Civil de 2002. No entanto, importante salientar que a previsão do Código de 1916 continua sendo aplicada nos casos em que a sucessão foi aberta durante a sua vigência[4], ou seja, caso o óbito do (a) cônjuge ou companheiro (a) tenha ocorrido antes do Código de 2002.
Caso o cônjuge/companheiro sobrevivente possua outros bens em seu patrimônio pessoal, ainda faz jus ao Direito Real de Habitação?
Sim. Uma das finalidades do instituto é impedir que, após o óbito do outro cônjuge/companheiro, o sobrevivente seja excluído do imóvel em que o casal residia[5], visando preservar o vínculo afetivo e psicológico estabelecido pelo casal com o imóvel. Inclusive esse é o posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça[6].
[1]Enunciado 117 do Conselho da Justiça Federal: O direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei n. 9.278/96, seja em razão da interpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6º, caput, da CF/88.
[2]FARIAS, Cristiano Chaves de; BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; ROSENVALD, Nelson. Manual de direito civil: volume único. 2. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2018.
[3] Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
[4]Art. 2.041. As disposições deste Código relativas à ordem da vocação hereditária (arts. 1.829 a 1.844 ) não se aplicam à sucessão aberta antes de sua vigência, prevalecendo o disposto na lei anterior (Lei n o 3.071, de 1 o de janeiro de 1916).
DIREITO DAS SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO ABERTA NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ART. 1.611, § 2º, DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. EXTINÇÃO.CONSTITUIÇÃO DE NOVA ENTIDADE FAMILIAR. UNIÃO ESTÁVEL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. O recurso especial debate a possibilidade de equiparação da união estável ao casamento, para fins de extinção do direito real de habitação assegurado ao cônjuge supérstite. 2. Em sucessões abertas na vigência do Código Civil de 1916, o cônjuge sobrevivente tem direito real de habitação enquanto permanecer viúvo. 3. A atribuição do direto real de habitação consiste em garantia do direito de moradia por meio da limitação do direito de propriedade de terceiros, uma vez que herdeiros e legatários adquirem o patrimônio do acervo hereditário desde a abertura da sucessão, por força do princípio da saisine. 4.Conquanto o marco para extinção fizesse referência ao estado civil, o qual somente se alteraria pela contração de novas núpcias, não se pode perder de vista que apenas o casamento era instituição admitida para a constituição de novas famílias. 5. Após a introdução da união estável no sistema jurídico nacional, especialmente com o reconhecimento da família informal pelo constituinte originário, o direito e a jurisprudência paulatinamente asseguram a equiparação dos institutos quanto aos efeitos jurídicos, especialmente no âmbito sucessório, o que deve ser observado também para os fins de extinção do direito real de habitação. 6.Tendo em vista a novidade do debate nesta Corte Superior, bem como a existência de um provimento jurisdicional que favorecia o recorrido e o induzia a acreditar na legitimidade do direito real de habitação exercido até o presente julgamento, deve o aluguel ser fixado com efeitos prospectivos em relação à apreciação deste recurso especial. 7.Recurso especial provido. (REsp 1617636/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 03/09/2019)
[5]FARIAS, Cristiano Chaves de; BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; ROSENVALD, Nelson. Manual de direito civil: volume único. 2. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2018.
[6] RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DIREITO DAS SUCESSÕES. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ART. 1.831 DO CÓDIGO CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL RECONHECIDA. COMPANHEIRO SOBREVIVENTE. PATRIMÔNIO. INEXISTÊNCIA DE OUTROS BENS. IRRELEVÂNCIA. 1.Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs2 e 3/STJ). 2. Cinge-se a controvérsia a definir se o reconhecimento do direito real de habitação, a que se refere o artigo 1.831 do Código Civil, pressupõe a inexistência de outros bens no patrimônio do cônjuge/companheiro sobrevivente. 3. Os dispositivos legais relacionados com a matéria não impõem como requisito para o reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens, seja de que natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge/companheiro sobrevivente. 4. O objetivo da lei é permitir que o cônjuge/companheiro sobrevivente permaneça no mesmo imóvel familiar que residia ao tempo da abertura da sucessão como forma, não apenas de concretizar o direito constitucional à moradia, mas também por razões de ordem humanitária e social, já que não se pode negar a existência de vínculo afetivo e psicológico estabelecido pelos cônjuges/companheiros com o imóvel em que, no transcurso de sua convivência, constituíram não somente residência, mas um lar. 5. Recurso especial não provido. (REsp 1582178/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 14/09/2018)
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